quarta-feira, 12 de março de 2014

Já Vi(vi) este Filme, por José Carlos Maltez

Já Vi(vi) este Filme
Por José Carlos Maltez, de A Janela Encantada


Quando se vê muito cinema, não é difícil depararmos com situações que nos façam lembrar de nós. Diz-se que se a arte imita a vida, a vida por vezes também teima em imitar a arte. Poderia falar de dezenas de exemplos, falarei do primeiro que me ocorreu.

A situação que escolhi é deveras pessoal, passada num momento conturbado da minha vida. Um daqueles momentos em que parece que nos vemos de fora de nós próprios, como num filme, pois são vividos com demasiada intensidade para no momento conseguirmos acompanhá-los em toda a sua plenitude.

O episódio envolve uma separação, a qual evoluía de uma distância física entre mim e a pessoa amada, distância essa que se tornava maior que nós, não deixando espaço a que as situações por resolver tivessem oportunidade de o serem. Espaço era mesmo a palavra que eu ouvia, espaço e tempo, esse binómio einsteiniano que se virava contra mim, aprendiz de físico. O espaço que é necessário para se crescer, o tempo que é necessário para se evoluir, o espaço-tempo humanos que às vezes imploramos para pormos a cabeça no lugar, descobrir quem somos e o que verdadeiramente queremos.

Mas eu sabia quem era, o que queria e quem queria. Sabia que não precisava de mais espaço ou tempo. Sabia que tudo o que houvesse para resolver/aprender/decidir sê-lo-ia mais facilmente comigo presente. Mas dos dois só eu pensava assim. O espaço tornou-se alguns milhares de quilómetros, tempo tornou-se semanas, meses, a eternidade...

Por essa altura, no cinema, vi o filme Garden State de Zach Braff. O filme trata da relação de dois jovens com o mundo, e essencialmente consigo próprios, após um histórico de problemas psicológicos e emocionais, que os deixam entre a depressão e o suicídio. Um com o outro aprendem a voltar a ter esperança, e a acreditar numa relação a dois. Quando o momento da decisão chega (e lamento os spoilers para quem não viu o filme), é tomada aquela que vem nos livros (parafraseando) "Agora que tenho esperança, tenho que voltar a compor a minha vida, ser auto-suficiente, para ter uma chance contigo, senão estrago tudo".

Só que tomada esta decisão "racional", o lado emocional toma o controlo, e assistimos ao volte-face, em que se assume que o que se decidiu antes foi burro (parafraseando novamente) "isto é a vida, eu não estou bem, mas isto sou eu, amo-te, e perder mais tempo é ridículo, pois o que eu tiver a organizar na minha cabeça será contigo ao meu lado".

Belisquei-me. Era Zach Braff que falava, ou era eu? Saí do filme absolutamente destroçado. Afinal alguém tinha passado pelo mesmo, e aceite a solução que eu tinha proposto. Não era ilusão minha. Aquilo que eu pensara como correcto, era decisão tomada por outros. Senti-me vingado por aquele filme. Como se me tivesse dito "Tinhas razão! Era esse o caminho!" Como se nele eu pudesse ter vivido um bocadinho do que a vida não me deixou.

Espero que se, um dia, certa pessoa o vir, ou tiver visto... se lembre de mim!

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Obrigada pela tua participação, José Carlos!

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