domingo, 24 de setembro de 2017

MOTELx'17: As curtas-metragens portuguesas

O MOTELx'17 terminou no dia 10 de Setembro, mas nunca é tarde para falar das curtas-metragens que estiveram na corrida para o Prémio MOTELx - Melhor Curta de Terror Portuguesa. Thursday Night sagrou-se vencedora, mas aqui, vamos fazer uma breve análise às nomeadas *.


A Instalação do Medo, de Ricardo Leite


É a partir do livro de Rui Zink, A Instalação do Medo, que esta curta-metragem homónima se constrói. Ricardo Leite trabalhou a história de modo a adaptá-la ao cinema e tirar o melhor partido dela. A Mulher abre a porta de casa. Aparecem dois homens: "Bom dia, minha senhora. Viemos para instalar o medo".

O argumento é o ponto mais forte, criando um intenso suspense, com uma banda sonora a condizer. Há pistas que anunciam o final, a iluminação joga com os medos da protagonista (ou nossos?), com a montagem de som a tornar tudo mais arrepiante e, ao mesmo tempo, repleto de sarcasmo. Os diálogos bem construídos são potenciados pelo bom trabalho dos três actores: Margarida Moreira, Nuno Janeiro e Cândido Ferreira.

#blessed, de Diogo Lopes


#blessed é uma divertida curta-metragem onde o humor negro é rei - e as mulheres rainhas. As redes sociais são alvo de chacota, ou talvez a importância que lhes é dada o seja. Duas amigas sempre atentas às futilidades das redes sociais vêem-se arrastadas para uma confrontação que as irá obrigar a lutar pela vida.

Matilde Breyner, Sara Salgado, Salvador Sobral e Ana Sofia Martins dão vida às personagens propositadamente estereotipadas e fazem da plateia testemunha das suas fotografias junto ao rio - e vão para o instagram.

Carga, de Luís Campos


Sem diálogos e com actores amadores, Carga parece uma docuficção. Numa pequena vila piscatória, dois rapazes são forçados a tomar parte activa no tráfico de substâncias ilícitas. Quando o mais velho prepara um plano de fuga, o mais novo vê-se obrigado a lidar com as adversidades de ser deixado para trás.

Em Carga, Luís Campos filma um local que parece saído de um filme expressionista, onde se encontram ruínas fantasmagóricas um pouco por toda a parte. É no cenário - real - que reside o maior elemento de "terror" desta curta-metragem que filma os caminhos de terra, os carris dos comboios e o mar, e por ali nos faz acompanhar a rotina dos homens: pescadores, traficantes e crianças - cujos olhares dizem tudo.

Depois do Silêncio, de Guilherme Daniel


Depois do Silêncio é muito forte visual e esteticamente, transportando-nos para o terror de época, onde um homem insiste em não morrer, levando a mulher à loucura. Ela esforça-se para aceitar a inesperada morte do marido, mas é confrontada com o seu recorrente retorno.

O silêncio do título predomina, o ambiente é pesado e as imagens pintam quadros. Depois do Silêncio chega a ser romântico, mas é igualmente brutal. A aura que nos transporta para outros tempos é adensada pela excelente direcção artística, pelas cores e fotografia. Por outro lado, a protagonista, Ágata Pinho, tem o visual ideal, entre a pureza e a determinação, entre o amor e o desespero.

Mãe Querida, de João Silva Santos


Uma mãe (pouco) querida, um copo de vinho, uma adolescente magoada, um gato preto e uma bruxa. Eis os ingredientes para Mãe Querida, de João Silva Santos. Matilda é uma jovem assombrada pela morte do pai e maltratada pela sua mãe alcoólica, Susana. Um dia, decide pedir ajuda a uma bruxa.

A curta-metragem traz-nos uma história simples e incómoda, onde ao lado mais realista da mãe alcoólica e da filha revoltada, se juntam elementos de fantasia e misticismo, que resultam num ambiente muito original. Dominado pelos tons fortes e vibrantes do néon e pelo fumo que torna tudo uma espécie de limbo entre realidade e alucinação, Mãe Querida não esquece a música que lhe deu o nome.

O Candeeiro - Um Filme à Luz de Lisboa, de Henrique Costa e Hugo Passarinho


Um cão, um gato, um polícia, um talhante e um candeeiro. Lisboa é o cenário desta curta-metragem de animação, repleta de humor negro muito bem construído e hilariante. Os pormenores das ruelas, desde o eléctrico, às pedras da calçada, transportam-nos para uma animação fiel às ruas da capital.

O Candeeiro - Um Filme à Luz de Lisboa, de Henrique Costa e Hugo Passarinho surgiu nas suas cabeças há muitos anos, e transporta-nos para memórias de infância dos realizadores. É uma história sobre escolhas, sobre os velhos tempos de uma Lisboa por descobrir, sobre as suas vielas escuras e sobre elegantes posters pintados à mão.

Revenge Porn, de Guilherme Trindade


Em Revenge Porn, Wayne é um homem simpático que respeita as mulheres, sorri-lhes e acaricia-as com a mesma mão com que depois se toca a pensar nas coisas obscenas que lhes quer fazer. Wayne odeia que lhe digam não. Mas a vingança está a chegar.

Revenge Porn é a inspirada curta-metragem de Guilherme Trindade. O que, de início, parece uma comédia negra leve, depressa toma proporções mais sérias onde as mulheres é que mandam - e sabem bem como vingar-se de quem não as respeita. Para além do argumento, que faz da vingança o principal atractivo - onde a webcam parece ser a principal arma - , com o gore a tomar o lugar da sensualidade, o filme vibra com as cores néon que acompanham este dia fatídico de Wayne.


Thursday Night, de Gonçalo Almeida


Gonçalo Almeida oferece-nos uma história de fantasmas onde os actores ladram e têm quatro patas. Durante a noite, um estranho presta uma visita a Bimbo para lhe entregar uma mensagem importante.

Thursday Night possui um belíssimo visual fantasmagórico, com uma excelente direcção de fotografia e montagem. A utilização do slow motion, em alguns momentos, favorece ainda mais o ambiente sobrenatural daquela noite. O protagonista, Bimbo, é tão ou mais expressivo do que um humano, e toda a curta-metragem tem em nós um efeito entre a melancolia e a nostalgia, com muita ternura.


*Não tivemos possibilidade de assistir em tempo útil à curta-metragem Entelekheia, de Hugo Malainho. Assim que a oportunidade surgir adicionaremos um texto sobre ela a este artigo.

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